
Há cerca de um mês, andávamos a regar o jardim, quando a minha mãe reparou nuns olhinhos pequeninos e famintos, que a espreitavam. Era uma cadelinha minúscula, tão magrinha, tão aterrorizada, que parecia ainda mais pequena. Entrara, possivelmente, por um pequeno espaço do portão e escondera-se na cama do Marco, o nosso cão sénior.
Apanhá-la foi tudo menos fácil, ela cabia em qualquer espacinho e nem dava para perceber se era uma cachorrinha ou já adulta. Uma coisa era certa, era de porte pequeno.
Consegui, por fim, apanhá-la com a ajuda de comida; ela estava famélica e devorou tudo à maior das velocidades. A cadelinha rosnava-me quando a tentava agarrar, por isso fui tentando ganhar a confiança dela até lhe conseguir pegar. Coloquei-a na transportadora do meu gato Dean e levei-a ao Centro Veterinário da Estação (Faro) para saber se tinha chip. Não tinha.

Como era uma situação temporária, decidimos ficar com ela até se encontrar o dono ou uma solução melhor. A minha casa tem escadas abertas e é um perigo para um animal tão pequeno e nervoso; por isso, tive de a prender numa casa de banho durante o tempo em que não podia estar com ela.
Ela era tão assustadiça que qualquer barulho a fazia espernear e entrar em pânico. Por isso, tinha me aproximar devagarinho, sem fazer barulho, deixá-la cheirar a minha mão e, quando finalmente lhe conseguia pegar, apenas o fazia a uma distância próxima do chão para que ela não se aleijar ao tentar escapar.
O estado em que este animal chegou era deplorável e cheio de incongruências. Não tinha pelo no dorso, mas ao mesmo tempo parecia tosquiada. A pele coberta de cicatrizes, em especial dorso e orelhas. Havia também sinais de carraças e pulgas, mas apenas resíduos secos, o que sugeria que já alguém tinha cuidado dela. Também parecia ter sarna, por isso, separei-a dos outros animais e usava luvas para lhe fazer festas. Afinal era apenas uma dermatite.
Ela tremia imenso. Era tão pequenina e enrolava-se tanto, que me fazia lembrar uma bolachinha. Comecei a chamar-lhe Cookie.

No dia seguinte levei-a ao veterinário novamente, com mais tempo, para uma consulta. Havia alguns aspetos que não faziam sentido. Ela tinha marcas de carraças e de maus tratos, mas estava tratada. Ou seja, alguém a encontrou antes de nós. Com a ajuda da Vet, pusemos anúncios no Facebook e um senhor, a dada altura, referiu que ela tinha sido encontrada a alguns quilómetros da minha casa, tratada noutra cidade e entregue a uma família da qual fugiu duas vezes. O que até fez sentido, porque mesmo aqui ela estava constantemente a tentar fugir. Contudo é triste saber que ela tinha sido adotada e a deixaram fugir sem que houvesse tentativas de a procurar.
Também não conseguimos saber a idade dela. Pelo estado dos dentes, parecia ter cerca de 4 anos. Olhando para ela, parecia bebé, mas passava tanto tempo encolhida que não dava para perceber pelo comportamento.
O pelo estava em tão mau estado que foi receitado um champô de tratamento para lhe dar banho de dois em dois dias até que melhorasse.

Socialmente, a Cookie não estava a fazer progressos. Ficava muito ansiosa quando eu a deixava sozinha. Arranhava a porta, choramingava e não nos deixava dormir de noite, apesar de, durante o dia, eu estar com ela a maior parte do tempo. Mesmo assim, sempre que a deixava sozinha, ela entrava em pânico e queria fugir. Inclusive, tentou saltar da varanda (onde estava sempre com supervisão) e isto tornou alguns aspetos claros: ela iria fugir ou aleijar-se à primeira oportunidade; não tinha sido socializada e, de traumatizada que estava, ia precisar de treino profissional; e, por fim, eu não tinha a bagagem necessária para a ajudar. Por isso, decidi contactar uma associação de animais, mas enquanto a resposta deles tardou, descobri que a Cookie se dava muito bem com o Marco, seguia-o para todo o lado e não parecia nada nervos. Quando a associação respondeu a dizer que tinha lugar para ela, já a Cookie se estava a adaptar e já nós tínhamos decidido ficar com ela.
A Cookie ainda é tímida e tem medo de estranhos, mas é extremamente sociável e brincalhona com outros animais. Primeiro só brincava com o marco. Depois, brincava comiga também, mas só quando não estava mais ninguém a ver. Não demorou até eu ganhar também estatuto de cão. Agora, ela fica à vontade relativamente rápido. Só falta dar-se bem com o Dean (o senhor gato), que parece querer brincar com ela, mas tem medo de cães e alguns ciúmes.

De momento, ela corre e brinca no quintal tem ar nenhum de querer fugir. O Marco, que tem cerca de 16 anos, ficou muito mais ativo e brincalhão desde que a Cookie está connosco. Ela própria nem parece o mesmo animal encolhido e infeliz que nos apareceu. Já tem pelo novo no corpo todo, não treme, brinca e ladra (durante os primeiros dias não fazia barulho nenhum) e brinca com brinquedos. Já sai de trela e porta-se bem, ainda que se encolha ocasionalmente com barulhos altos.
Cá em casa, dá-me mais confiança a mim do que a qualquer outra pessoa, mas mesmo assim ainda foge de mim se eu não anunciar a minha presença antes.

Juro que pensei que não conseguia fazer nada dela. A Cookie era e é um animal demasiado traumatizado para um dono comum. Precisava de paciência e dedicação. Nunca teria conseguido fazer progressos com ela se não tivesse o Marco, que acaba por lhe mostrar que não precisa ter medo. Desta forma é muito mais fácil treiná-la. Apesar de terem cestas diferentes, dormem juntos, comem juntos e brincam. Com esta adoção inadvertida, ficaram dois animais felizes e nós também, por fazer parte disto tudo.
A pandemia acabou por trazer coisas boas, como a disponibilidade para me dedicar a ela. Ela está connosco há pouco mais de um mês e já faz uma diferença tão grande! O amor fez a diferença toda, na verdade.
Fiquem atentos, que vou publicando mais
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